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O OVO OU A GALINHA?

São Paulo, 4 de fevereiro de 2022.


Caros(as) cotistas e parceiros(as),


Em nossos processos de análise, uma das etapas fundamentais é tentar identificar quais são os fatores que são os reais causadores de determinados eventos.


Já argumentamos, por exemplo, que os preços das ações perseguem os lucros das empresas. Em países desenvolvidos, os lucros acompanham o crescimento das receitas das empresas, que por sua vez seguem o crescimento de PIB. Portanto, países que crescem mais têm empresas que crescem mais e bolsas mais apreciadas. Mas será que são as economias que fazem as empresas crescerem ou são as empresas que fazem a economia crescer?


Nos últimos meses, o grande debate do mercado financeiro tem sido em torno da política monetária do Fed, o banco central americano. Desde o final do ano passado, seu presidente, Jerome Powell, mudou o discurso com relação à inflação. Antes tida como transitória, a retórica migrou para uma inflação acima do esperado e que precisa ser combatida. Mas, afinal, quais são os fatores geradores da inflação?


O custo das empresas

Quando desenvolvemos nossos modelos de avaliação de empresas, um dos componentes mais importantes da projeção é a estrutura de custos. Assim como as três cores primárias (amarelo, vermelho e azul) derivam todas as outras cores, os custos primários das empresas podem ser essencialmente divididos em três: energia, pessoas e tecnologia. Quase todos os outros custos derivam desses três.


Peguemos um automóvel como exemplo. O Fiat Strada foi o carro mais vendido no Brasil em 2021. As principais matérias-primas de um carro a combustão são aço, alumínio, plástico e borracha. Trabalhadores pegam esses insumos e, com auxílio de máquinas (tecnologia) e energia, os transformam em motores, painéis, rodas e portas.


O veículo pesa 1.078 kg e, se fosse feito todo de aço, o custo da matéria-prima seria de aproximadamente R$4.500. Um Strada novo é vendido por pelo menos R$90.000. Boa parte da diferença não é o lucro da Fiat, mas o custo de outras pessoas, tecnologias e energias utilizadas no processo de produção do veículo.


O super ciclo de commodities

A recente alta nos preços das commodities ainda persiste. Já falamos que podemos estar no meio de um novo super ciclo de preços de commodities. Isso não significa que os preços sobem indefinidamente, mas sim que, durante um período mais longo, os preços ficam acima de suas médias históricas.


O último grande ciclo de preços de commodities foi no início dos anos 2000. O que vimos ali foi uma combinação de três fatores principais: alguns anos de baixo crescimento econômico mundial, queda significativa de investimentos pelos produtores e um grande choque de demanda. Desde o final da década de 2010, estamos vendo a repetição desses três fatores, que pode levar a preços mais elevados.


O gráfico abaixo mostra uma média de preços de petróleo, cobre e minério de ferro em termos reais desde 1900:

O que chama nossa atenção no ciclo atual é que o comportamento dos produtores privados tem sido diferente. A resposta tradicional a preços mais elevados é de fomentar novos investimentos para aumento de produção. Não desta vez. Mesmo com preços mais altos, o aumento da oferta tem sido muito aquém do esperado.


O pano de fundo é que as empresas estão mais receosas em fazer novos investimentos e sendo pressionadas para pagar dívidas e dividendos. Além disso, podemos apontar aqui alguns outros pontos específicos. As incertezas políticas no Peru e Chile atrasam novos investimentos em minas de cobre, à espera de uma definição de uma nova regulamentação do setor nesses países.


No petróleo, a expectativa de descarbonização do mundo pode fazer com que as empresas invistam cada vez menos em produção. As pressões ambientais sobre os bancos, por exemplo, também podem restringir o acesso a financiamento dessas empresas, levando a um maior custo de capital. Um maior custo de capital demanda um maior preço de longo prazo. Mas se o mundo vai reduzir o consumo de petróleo ao longo do tempo, o que acontecerá com os preços de petróleo no longo prazo?


A falta de investimentos no setor, junto com um forte estímulo econômico pós-pandemia, fez com que os diferentes mercados de commodities ficassem mais apertados. O gráfico abaixo mostra o nível de estoque de petróleo atual comparado com a média dos últimos cinco anos:

O baixo nível de estoques faz com que os preços de curto prazo fiquem mais sensíveis a quaisquer choques de oferta. No início do ano, por exemplo, as chuvas no Brasil impactaram a produção de minério de ferro, que fez com que os preços na China subissem.


No petróleo, analistas atribuem um pedaço da alta do combustível às recentes tensões entre Rússia e Ucrânia. Eventos dessa natureza são difíceis de serem antecipados. E uma pequena ruptura na cadeia de produção pode ter um impacto desproporcionalmente alto nos preços.


Um outro ponto que pode ajudar este ciclo é uma reaceleração da economia chinesa. Nos últimos meses, o governo voltou a estimular a economia, podendo intensificá-lo adiante. Como maior consumidor das principais commodities, a China pode apertar ainda mais o mercado.


De volta a inflação. Assim, como no custo das empresas, acreditamos que energia, pessoas e tecnologia também expliquem, ao menos em parte, as variações da inflação. Lembrando que inflação é uma tentativa de mensuração de preços de produtos e serviços na economia. Em países emergentes, um outro componente deve ser adicionado: a variação da moeda.


Quando olhamos a variação da inflação, estamos também olhando a variação incremental de preços. Ou seja, se os preços de commodities se mantêm em um patamar elevado ou sobem moderadamente, a pressão inflacionária tende a se dissipar com o tempo.


O gráfico abaixo mostra a variação anual dos preços de commodities em reais (azul) e uma projeção dela (vermelho), assumindo os preços constantes.

Em abril de 2021, a variação anual era de 120%, um grande impulso para inflação. Salvo um novo salto de preços, essa variação tenderá a zero já em abril deste ano, possivelmente formando uma pressão desinflacionária.


Em nossa carta de dezembro, argumentamos que a queda projetada da inflação para os próximos dois anos é a maior dos últimos 20 anos. Uma boa parte da explicação deveria ser atribuída a essa queda na variação das commodities.


O passado

Uma alta da taxa de juros americana e dos preços de commodities fez com que as ações de empresas mais cíclicas tivessem uma performance bem superior às empresas consideradas de crescimento. Com um bom ponto de partida, essa movimentação teve um impacto muito positivo na bolsa brasileira.


O futuro

Seguimos otimistas com commodities, mas com cautela e diversificação. Afinal, preços mais altos de commodities pressionam a inflação para cima, que demanda políticas mais restritivas dos governos, que levam a um menor crescimento e, portanto, a um menor consumo e preços mais baixos de commodities.


Se esse for o cenário, commodities então podem ser, ao menos no curto prazo, uma proteção para um aumento de juros.


Agradecemos a confiança,


Dahlia

+55 11 4118-3148



Créditos Finais:

Imagem: Shutterstock

Gráficos: Bloomberg e Dahlia Capital








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